segunda-feira, março 31, 2008

Coisas que odeio - V

ODEIO pessoas que caminham rente ao chão. Pessoas cobardes, que não têm coragem para dar a cara e se refugiam atrás de falsos moralismos e puritanismos bacocos. Fazem-me comichão, atiçam-me a urticária, fico toda empolada só de estar na proximidade de uma.

E a minha grande preocupação é que elas parecem estar em proliferação activa, aparecendo por todo o lado, recrutando como vez mais aliados, funcionando cada vez mais como uma pequena sociedade, composta por várias tribos que se atacam e aliam alternadamente. Depende para onde sopra o vento.
Agonia-me verificar que não consigo interagir em sociedade sem tropeçar numa ou em várias destas pessoas. Não consigo mesmo. Na vida social, não sendo propriamente fácil, ainda consigo contornar estes jogadores, saltitando de grupo em grupo ao estilo de uma patinadora artística. Agora na vida profissional, impossível. Elas estão por todo o lado e, quando menos esperamos, atacam. Com uma maledicência lançada ao ar, um comentário mais ou menos corrosivo ou uma queixa aparentemente inocente, derramada nos ouvidos certos, estragam-nos o dia, quando não o mês ou o ano. E o problema não é o que pensam ou deixam de pensar, que isso é direito seu. O problema é a ausência daqueles frutos vermelhos e sumarentos que se usam nas saladas, é a faca espetada nas costas, é o cochicho debaixo do pano. Parece que a língua só funciona nas costas daqueles de quem falam ou cujo comportamento comentam. E tudo se sabe através de sussurros e rumores, de críticas que nunca partem de quem lhes deu origem. É triste e dispensa-se.

Conselho: endireitem a espinha, levantem a cabeça, ergam o queixo para o céu. Tenham a coragem de dizer o que pensam na cara, olhos nos olhos. É constrangedor, é. Magoa mais, magoa. Mas o efeito é imediato e, se não se conseguir evitar o rancor, pelo menos não se perde o respeito do interlocutor. Isto, ao invés de envenenarem o ar que vos rodeia, gerando um ambiente de desconfiança e raiva surdas, em que não há vencedores.

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segunda-feira, março 24, 2008

Aventuras ao volante

Há dias li uma afirmação com a qual concordo plenamente: “Qualquer português, por mais pacífico e cordato que seja, transforma-se num ser primitivo quando se senta atrás do volante.”. Recordando aquelas pessoas que, venham a que distância vierem, se nos vêem entrar numa rotunda em que teriam prioridade, aceleram desalmadamente para exercer os sues direitos (é assustador! Parece que querem vir conduzir o nosso carro), tenho de dizer que é mesmo verdade.

Uma vez que nos dispomos a conduzir, uma vez que sentimos a firmeza de um volante debaixo das mãos e o poder dos pedais sob os pés, assumimos uma nova personalidade. Uma personalidade forte, dominante e completamente egocêntrica. De repente, somos melhores que os outros, temos asas nos pés, um completo domínio das mãos e uma mente clara, limpa e empenhada num só objectivo: chegar ao destino o mais rápido possível. Enquanto encarnações de Fittipaldi, não percebemos como é que os azelhas que proliferam nas estradas ganharam o direito de lá estar. Bufamos, praguejamos e fintamos qualquer condutor que se encontre no nosso caminho, colamo-nos à traseira das viaturas que se atreverem a seguir numa velocidade 10 kms abaixo daquela que consideramos adequada e, quando finalmente conseguimos ultrapassá-las, num ângulo que desafia qualquer lei da geometria, lançámos um olhar de desprezo por cima do ombro aos pobres diabos que, obviamente, não foram bafejados pelo Deus da Condução.

Fiquei muito tempo a pensar que este comportamento totalmente anacrónico resultava de um descarregar de todas as frustrações que a vida actual provoca: um parceiro demasiado exigente, um chefe com pretensões a ditador, colegas conflituosos, etc. Mas hoje, finalmente, percebi a razão. A verdade é que os portugueses se estão a preparar para aquela altura em que vão ser chamados a cumprir uma missão, aquela altura que vai apagar para sempre a monotonia das suas vidas. Ávidos consumidores de filmes de acção americanos, estamos seguros de que um dia, quando menos esperarmos, alguém nos vai convidar para ir corajosamente até onde nenhum homem foi até agora, de que um agente secreto, cuja família tenha sido raptada por 5 colaboradores das melícias armadas de Israel, vai necessitar que o levemos com a maior rapidez até ao covil dos flibusteiros, de que o Peter Pan, tendo perdido temporariamente a sua capacidade de voar, vai depender de nós para apanhar o Capitão Gancho antes deste ser devorado pelo Tic-tac.

A verdade é que somos todos super-heróis em potência, mas o nosso poder especial só se revela ao volante de um carro, e tende a fazê-lo com maior intensidade ao som de uma banda sonora potente e bem ritmada. É então que todos os problemas ficam para trás e, não fossem os restantes carros que ocupam as pistas, estou certa que conseguiríamos mesmo voar.

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segunda-feira, março 17, 2008

Coisas que odeio - IV

ODEIO celulite. Muito. É bem capaz de ser a coisa que mais odeio. Não é que me perturbe mais que as restantes ou que influencie o meu bem-estar de forma mais determinante, é só porque as outras eu posso evitar, contornar ou rebater, mas esta… esta está colada a mim e, por mais rituais que leve a cabo, não há forma de a exorcizar.

Porquê, oh porquê que esta história havia de existir? E, a existir, porquê que não são os homens que a têm? Eu sei que não é muito correcto pensar assim, mas nós já temos com que nos entreter. Ter de passar a vida toda com oscilações hormonais e alterações de humor de fazer corar de inveja o Dr Jekill; ter de fazer depilação por todo o lado (incluindo os sítios mais inomináveis); ter de calcorrear calçadas e passeios em equilíbrio, em cima de saltos dignos de um acrobata; ter de manusear o batom e o lápis de olhos como se tivéssemos por mestre Rembrant; ter de dominar o básico da lide doméstica ainda antes de sabermos gatinhar (sob o risco de sermos enxovalhadas em praça pública); ter de considerar ter filhos obrigatoriamente e, de preferência, antes dos 25 anos; ter de escolher como companheiro alguém que seja médico cirurgião e que ganhe, no mínimo, 7 vezes mais que nós (para não ter de lidar egos feridos e parentes desiludidos); etc., etc., etc. Convenhamos que ter de fazer a barba diariamente e tremer perante uns cabelos a mais na almofada nem se comparam a esta vida inteira de provações, privações e oscilações.

E, para cúmulo, ainda temos de levar com a amiga celulite a estragar tudo o que toca, e ouvir que isso acontece porque o nosso corpo é tão perfeito que, prevendo a necessidade de gordura em tempo de gravidez, se distrai a acumulá-la por zonas que nada têm a ver… isto ainda que estejamos a pensar em tudo menos em berços, fraldas e babetes. Ora, por favor!

Se é esse o caso, meu Deus, eu não preciso de ser tão perfeita. Deixe estar, não quero, não vale a pena. Nesse ponto, basta ser como um homem, ok?

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segunda-feira, março 10, 2008

Agora é tudo gay?

Não estou a perceber muito bem o que se está a passar, mas parece que todo o universo está a virar para o outro lado. Como é que eu sei? Fácil. Experimentem elogiar fisicamente um homem a outro homem e, em 75% dos casos, é vê-lo a responder prontamente: “Esse gajo é gay.”. Ou, numa vertente mais moderada, “A mim, parece-me que esse gajo é gay.”.

A ser verdade, confesso que este facto me deixa algo desconcertada e bastante deprimida. Então eles já são tão poucos e ainda se põem com estas brincadeiras? Já não basta termos de nos preocupar com o restante mulherio, ainda temos de começar também a deitar olhares laterais e a rosnar para os engraçadinhos que se entretêm a coleccionar conquistas do mesmo sexo? E depois admiram-se que as mulheres tenham cada vez mais achaques e crises nervosas…
A ser mentira, o que me parece bem mais provável, devo dizer que os homens estão a ficar bastante parcos em imaginação. Só isso explica o facto de recorrerem sucessivamente, e em bloco, ao mesmo argumento. Será que eles não temem que, com a habitual argúcia feminina, nós desconfiemos que é pouco provável que o Brad Pitt, o George Clooney, o bonitão do 3º esquerdo, o simpático da mercearia e o professor do ginásio sejam todos irremediavelmente gays? E que só a pessoa que emite a opinião e mais meia dúzia de amigos próximos façam ainda parte do verdadeiro clube da testosterona?

E tudo isto para quê, exactamente? Para nos desmotivarem de sair em busca de paisagens mais verdejantes (“Não adianta, que dali não levas nada.”)? Para se auto promoverem aos nossos olhos (“Posso não ter aqueles abdominais a lembrar a escadaria do Bom-Jesus, mas ao menos sou muito macho.”)? Porque nos querem irritar profundamente, provocando uma fúria argumentativa com a qual não sabem lidar (“Mas como é que tu sabes disso? Quem foi que disse? Tu viste ou estás a inventar? Onde estão as provas?”)? Porque é o que eles gostariam de ouvir na mesma situação (“Ai ela é isso? Que fiiiixxeee!…”)?

Seja porque razão for, devo dizer que esta atitude de total negação e aniquilação da concorrência através do boato não fundamentado não resolve nada. Primeiro, porque quem conhece as mulheres sabe que, quando apaixonadas, estamos sempre preparadas para tentar mudar, com doses excessivas de amor e dedicação, qualquer traço de carácter mais ou menos vincado (incluindo um pequeno pormenor como a orientação sexual). Segundo, porque cada vez mais alinhamos pela cartilha de S. Tomé, e tendemos a querer comprovar com experiências empíricas os factos que nos colocam como irrefutáveis (afinal, podemos não chegar ao Brad, mas o jeitoso do Holmes Place está ali mesmo, à mão de semear). Terceiro, porque com a generalização o argumento perde a força (vá lá, senhores: não podem desatar a dizer que todos os homens dos arredores se converteram, sem levantar algumas suspeitas).

Para terminar, um aviso bem-humorado: usem a imaginação e mudem o disco, senão ainda correm o risco de começarmos a questionar o acesso a tanta informação privilegiada sem que se faça parte do clube.

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segunda-feira, março 03, 2008

A Bimbi

De repente, comecei a ouvir falar da Bimbi em todo o lado. O que é a Bimbi? É um robot de cozinha. E o quê que a Bimbi faz? Faz tudo.
Foi o que me disseram, assim mesmo: “…põem-se os ingredientes lá dentro e ela faz tudo.”. Minada pela curiosidade (e pela desconfiança), aceitei participar de uma demonstração. No entanto, com o meu habitual pessimismo, antes de lá chegar já tinha decidido que a tal máquina só tinha interesse para quem não sabe cozinhar, que era mais uma estratégia de marketing bem montada, e que nunca, nem que também fizesse as camas e lavasse as casas de banho, eu iria dar quase 1.000 Euros por ela.

Ora bem, confesso que tive de engolir alguns dos meus preconceitos. Para além de todo o espalhafato que se gerou em torno dela (não, não faz “tudo”), a Bimbi é muito interessante e, pareceu-me, um bom investimento para quem tem grandes famílias e pouco tempo. De facto, mais do que as receitas que permite executar sem grande esforço e de forma bastante saudável, a sua principal mais-valia reside no tempo livre que disponibiliza a quem a possuir. Hoje em dia, uma pessoa sabe que o bem mais precioso é precisamente o tempo, que parece nunca chegar para fazer tudo o que queremos. Foi por aí que a máquina me conquistou. Acaba com a ideia de que cozinhar implica estar com a barriga colada no fogão, à volta com colheres, tachos e panelas. Molhos, sopas, cremes e todas aquelas mistelas que temos de mexer em lume brando até engrossarem, tudo isso é feito automaticamente, com a ajuda de um ou dois apetrechos e, principalmente, um timer que nos permite ir laurear a pevide até que estejam prontos. Muito bom, muito prático, muito tempo que se ganha.

No entanto, eu gosto de cozinhar, e a Bimbi tira algum do prazer envolvido na confecção “caseira” dos alimentos. Passado o espanto inicial provocado pelas inovações da máquina (e pelo fantástico tempo, cuja falta tanto me atormenta), não sei se apostaria na sua compra. Eu gosto do “ram-ram” da cozinha, de cortar e laminar os alimentos, do cheiro dos refogados, carregadinhos de gordura. E, sobretudo, gosto demasiado dos 1.000 Euros depositados na minha conta, disponíveis para comprar tantas outras coisas...

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