terça-feira, junho 30, 2009

Cuidado com o que desejas

Eu e o meu cabelo temos uma relação de amor/ódio: ele ama deixar-me louca e eu odeio que ele o faça.

Eu sempre quis ter um cabelo com as seguintes características (por ordem de preferência): grosso, suave, com ondas naturais, preto (ou ruivo: very hot!) e comprido. Claro que, em linha com o que acontece com tudo o que eu desejo na vida, fui presenteada com um cabelo fino, liso e loiro (apesar de eu achar que é castanho claro, todos os cabeleireiros fazem questão de me informar que a base do meu cabelo é loira - nomeadamente quando eu insisto em fazer madeixas acobreadas, na tentativa de ficar com um aspecto “ruivo”). Salva-se o facto de ser suave e comprido. Mas claro que, sendo meu, é também cheio de personalidade e vontade própria: apesar de toda a suavidade, não há quem o faça enrolar para dentro se ele achar que fica bem é para fora, nem quem o consiga pentear quando ele cisma de se enredar num enorme novelo de nós.


Como se pode calcular, com esta matéria-prima, é-me sempre muito complicado mudar de estilo, arriscar, encontrar um novo look. Mas, de quando em quando, eu tento. Sempre num cabeleireiro da minha confiança, sempre depois de uma enorme fase de “Estou farta do meu cabelo!”, sempre quando já nem posso olhar para o espelho. Da última vez que o fiz, apostei numa franja que obteve bastante sucesso, e que apenas foi abandonada porque um redemoinho no canto esquerdo da testa me dava um ar de Tintim sempre que não tinha acesso a um secador (além disso, confesso que odeio usar secadores…).


Desta vez, meses após a última visita ao cabeleireiro (também odeio ir ao cabeleireiro) e com o Verão a dar ares da sua graça, deu-me a vontade de fazer algo diferente. Sábado de manhã, levantei-me e rumei à tesoura. Ainda pelo caminho, decidi que não chegava a habitual aparadela em que nunca ninguém repara, que o cabelo estava muito pesado e sem graça, e que o ideal seriam umas madeixas, para alegrar os meus dias.


Conversa entre mim e o cabeleireiro:

Ele (ar aborrecido, farto de saber que eu sou uma chata que nunca quero fazer nada diferente) - Então, o quê que vai ser?

Eu (a medo) - Não sei bem, mas queria algo diferente. Estou cheia deste cabelo! Estava a pensar numas madeixas…

Ele (só para me deixar ficar mal) - De que cor?

Eu (esperançada que passasse) - Não sei… estava a pensar acobreadas… O quê que acha?

Ele (sobrancelha levantada… ar de “Outra vez?!”) - Eu acho que têm de ser loiras… É a sua base…

Eu (suplicante) - Mas eu uma altura fiz umas acobreadas, juntamente com as loiras, e resultou bem, discreto…

Ele (cedendo, brilho estranho no olhar) - Podem fazer-se umas ruivas, para dar uns laivos de cor…

Eu (vitória!) - É, pode ser…


Cerca de 2 horas depois (sim, 2! Por isso é que eu odeio ir ao cabeleireiro), apanhei o susto da minha vida. Uma vez tiradas as pratas, lavado e desembaraçado o cabelo (operação que envolveu o uso de um creme e uma espuma especiais de corrida, só para que a minha cabeleira se dignasse a deixar passar o pente), e quando me preparava para enfrentar o corte, resolvi levantar os olhos da revista em que estava embrenhada e olhar para o espelho. Surpresa! A devolver-me o olhar estava a sósia de uma cabeleireira enlouquecida, completa com várias madeixas loiras e algumas (demasiado visíveis) madeixas vermelhas. Não acobreadas, não ruivas…vermelhas, mesmo! Ia caindo para trás. Mas não caí: aguentei firme até estar de cabelo bem cortado (“Apare só…”, que para loucura já basta a cor) e penteado.


Conversa final:

Ele (sorriso de orelha a orelha) - Então, o que acha?

Eu (sorriso amarelo) - Está um bocadinho puxado…

Ele (meio sorriso) - Isso depois disfarça com as lavagens.

Eu (sorriso conformado) - Pelo menos está diferente…

Ele (sorriso - que eu li como - irónico) - Lá isso está!


E pronto, cá estou eu, com um ar completamente diferente, a condizer com as cores do Verão, ainda a habituar-me ao novo visual. As boas notícias são que desta vez toda a gente reparou que eu tinha ido ao cabeleireiro.


Imagem: retirada do site www.online-literature.com

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terça-feira, junho 23, 2009

Era uma vez uma Gata

Há cerca de 9 anos, uma vizinha, sabendo que a minha família é constituída por Cat people, levou à minha mãe uma gatinha bebé. A ideia seria ficarmos com ela, mas a minha mãe, cansada de sofrer por lhe envenenarem os animais de estimação (sim, ainda há monstros que fazem coisas como esta), recusou. A alternativa? Segundo a minha vizinha, seria deitar o bichinho fora. E foi assim que a Gata entrou na minha vida. Incapaz de deixar que o animal (falo da minha vizinha) se livrasse da bolinha de pêlo, levei-a para minha casa (a bem da verdade diga-se que, na altura, estava em casa alheia, mas o dono ficou ainda mais rendido que eu à pequena visitante).


Apesar de obviamente arraçada de siamês (o tom azul dos olhos prova-o), a minha gata não era um gatinho lindinho, como nos habituamos a ver: estava bastante magra e a cabeça era um pouco desproporcional relativamente ao corpo (o que, quando andava, lhe dava um ar de boneco articulado, com as patas a tentarem encontrar o ponto de equilíbrio que a impedisse de tombar para a frente); por seu lado, as orelhas eram demasiado grandes para a cabeça e, para completar, os olhos, também enormes, acusavam um ligeiro estrabismo. Estão a ver, não? Parecia uma versão felina do Gremlin, o que justifica a primeira reacção do meu pai ao vê-la: “Que bicho feio!”. Por isso me admiro tanto que se tenha transformado num dos gatos mais bonitos que já vi: a pelagem listada num jogo de tons creme claro e cinza escuro, uns fantásticos olhos azuis, realçados com risco negro natural, um focinho de traços fortes e uma elegância ímpar.


Mas se o aspecto actual conquista qualquer pessoa, o que realmente a torna única é o seu feitio especial. Além dos habituais estragos na mobília, cortinas e tapetes, esta gatinha sempre gostou de acelerar a grande velocidade pelos corredores da casa, derrapando nas esquinas e embatendo de frente contra qualquer obstáculo (influências do "pai"?...), de trepar as laterais das portas, até ficar mais ou menos ao nível dos nossos olhos, só para nos atirar um “miau!”, de levar uns snacks da cozinha para a sala, acompanhando-nos nas maratonas em frente à televisão (e quando falo de snacks, refiro-me, por exemplo, a 2 fatias de pão com uma de fiambre…), de se atirar pela janela do 3º andar atrás de um pombo mais distraído, etc, etc. E estas diabruras não são nada ao pé de uma personalidade verdadeiramente vincada: dos amuos, quando por alguma razão não se lhe dá a atenção que ela julga merecer (que incluem sentar-se de costas para nós, mirando distraidamente por cima do ombro), aos lendários ataques de ciúmes quando dirigimos a atenção para alguém que não a deusa em forma de gata (desde afastar mãos com as 2 patas a deitar-se em cima da cabeça que esteja no colo pretendido, vale tudo).


Nesta gata se conjuga tudo o que associamos a um felino. Daí que, quando foi necessário dar-lhe um nome, optei pelo que melhor a descreve: Gata. Assim mesmo, com letra grande e garras de fora. Porque esta não é uma mera gata, é a Gata.

Imagem: Gata, 2004

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terça-feira, junho 16, 2009

Pau que nasce torto nunca se endireita

A minha mãe diz-me várias vezes que este ditado não deve ser levado à letra, que existem inúmeros casos de pessoas que se “endireitaram” (ou melhor, a quem a vida endireitou). Eu gostaria muito de pensar que sim, que as pessoas mudam, mas a verdade é que não acredito nada nisso. Na verdade, concordo plenamente com o ditado popular.


Eu até aceito que a personalidade possa ser ajustada, que qualquer pessoa pode fazer um esforço para se tornar mais simpática, mais interessante, mais disponível, mais sociável. Agora, o carácter está lá e nada o pode mudar. Ou se é “boa” pessoa ou não. Tão simples quanto isto. Se uma pessoa tem má índole, se é egoísta, invejosa, prepotente, sem escrúpulos, então não há boa vontade que lhe valha. As circunstâncias até podem levá-la a moderar estas características, a ocultá-las sob uma capa de civismo, mas elas estão lá e, a qualquer momento, voltam a emergir com as garras de fora. Por isso se ouve tantas vezes frases como “Oh pá, eu pensava que ele/a tinha mudado, mas afinal…”. É a previsível desilusão daqueles que são bons demais, que gostam de ver sempre o melhor nas pessoas, que acreditam nos finais felizes.

Quando se pretendem relações sólidas e duradouras, sejam de amizade ou amor, o ideal é apostar em pessoas que tenham um bom carácter, pessoas com as quais podemos contar sempre e incondicionalmente (ainda que a sua personalidade não seja das mais cativantes). No entanto, todos sabemos o que é ser seduzido por pessoas cuja personalidade é ostensivamente deslumbrante, pessoas com um charme e uma capacidade de atracção inatos, apenas para verificar mais tarde que o carácter deixa algo a desejar.

Eu já sofri desgostos bem grandes por causa deste encandeamento inicial, da vontade de acreditar que as pessoas são o que parecem; mas uma vez que o verdadeiro íntimo se revela, não me é muito difícil cortar toda e qualquer ligação com pessoas que nasceram “tortas”. Precisamente porque, dependendo da gravidade das atitudes, não acredito que venham a mudar.


No fundo, é tudo uma questão de saber quais as pontes a atravessar e quais as pontes a queimar. Já sei que esta é a decisão mais difícil de tomar, até porque temos sempre receio de estar a desperdiçar aquela última oportunidade (e, se calhar, agora é que a pessoa mudou mesmo…). Em caso de dúvida, o meu conselho é recorrer à sabedoria popular: nasceu torto? Então, vai morrer torto.

Imagem: retirada do site desciclo.pedia.ws

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terça-feira, junho 09, 2009

O que eu queria viajar daqui para fora

Eu adoro viajar. Por mim andava sempre no laréu, a apanhar aviões, táxis e metros, a visitar novas e excitantes cidades e civilizações, a visitar monumentos, museus e restaurantes, sempre acompanhada do meu Guia American Express.


Por volta dos meus 13 anos descobri que, com alguns trocados, era possível ir visitar aquelas terras que tanto me fascinavam nos filmes e livros. E, vai daí, não parei mais. Durante 15 anos foi um vê-se-te-avias de bilhetes de avião, reservas e câmbios; passeei imenso, diverti-me mais ainda e procurei conhecer o máximo possível de todas as culturas que visitei. Mas, aos 28 anos perdi a minha companheira de viagem (que, por razões nobres, teve de moderar o ímpeto descobridor da alma portuguesa). A partir daí fui-me acomodando e as férias foram sendo passadas sem grandes emoções, em sítios mais ou menos familiares.


Nos últimos tempos tive o prazer de recuperar o fascínio por conhecer coisas novas, por falar com pessoas diferentes, por sair do mundinho pequenino que nos espreme os horizontes. E a febre voltou a arder por baixo da pele: o que eu quero mesmo é conhecer o mundo. O mundo todo, das ilhas paradisíacas da Tailândia à loucura cosmopolita de Nova Iorque. Quero cheirar os campos de flores na Holanda e saborear um churrasco nas Pampas. Quero caminhar pelas montanhas do Tibete, enrolada num bom cobertor, e nadar entre tubarões na Nova Zelândia (ok, aqui talvez esteja a exagerar um pouco…).


Enfim, o que eu queria mesmo era matar a rotina que me está a espartilhar a alegria, a rasgar cada réstia de potencial e a anular a pessoa que gostaria de ser. Gostava imenso de acordar um dia com a coragem (e com a dose de inconsciência necessária) para largar tudo o que não interessa, pegar em tudo o que realmente me faz falta e partir. Afinal, nunca ouvi nenhum moribundo queixar-se de que devia ter passado mais tempo no escritório ou fechado em casa.


Imagem: férias Munique 2009

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