segunda-feira, março 24, 2008

Aventuras ao volante

Há dias li uma afirmação com a qual concordo plenamente: “Qualquer português, por mais pacífico e cordato que seja, transforma-se num ser primitivo quando se senta atrás do volante.”. Recordando aquelas pessoas que, venham a que distância vierem, se nos vêem entrar numa rotunda em que teriam prioridade, aceleram desalmadamente para exercer os sues direitos (é assustador! Parece que querem vir conduzir o nosso carro), tenho de dizer que é mesmo verdade.

Uma vez que nos dispomos a conduzir, uma vez que sentimos a firmeza de um volante debaixo das mãos e o poder dos pedais sob os pés, assumimos uma nova personalidade. Uma personalidade forte, dominante e completamente egocêntrica. De repente, somos melhores que os outros, temos asas nos pés, um completo domínio das mãos e uma mente clara, limpa e empenhada num só objectivo: chegar ao destino o mais rápido possível. Enquanto encarnações de Fittipaldi, não percebemos como é que os azelhas que proliferam nas estradas ganharam o direito de lá estar. Bufamos, praguejamos e fintamos qualquer condutor que se encontre no nosso caminho, colamo-nos à traseira das viaturas que se atreverem a seguir numa velocidade 10 kms abaixo daquela que consideramos adequada e, quando finalmente conseguimos ultrapassá-las, num ângulo que desafia qualquer lei da geometria, lançámos um olhar de desprezo por cima do ombro aos pobres diabos que, obviamente, não foram bafejados pelo Deus da Condução.

Fiquei muito tempo a pensar que este comportamento totalmente anacrónico resultava de um descarregar de todas as frustrações que a vida actual provoca: um parceiro demasiado exigente, um chefe com pretensões a ditador, colegas conflituosos, etc. Mas hoje, finalmente, percebi a razão. A verdade é que os portugueses se estão a preparar para aquela altura em que vão ser chamados a cumprir uma missão, aquela altura que vai apagar para sempre a monotonia das suas vidas. Ávidos consumidores de filmes de acção americanos, estamos seguros de que um dia, quando menos esperarmos, alguém nos vai convidar para ir corajosamente até onde nenhum homem foi até agora, de que um agente secreto, cuja família tenha sido raptada por 5 colaboradores das melícias armadas de Israel, vai necessitar que o levemos com a maior rapidez até ao covil dos flibusteiros, de que o Peter Pan, tendo perdido temporariamente a sua capacidade de voar, vai depender de nós para apanhar o Capitão Gancho antes deste ser devorado pelo Tic-tac.

A verdade é que somos todos super-heróis em potência, mas o nosso poder especial só se revela ao volante de um carro, e tende a fazê-lo com maior intensidade ao som de uma banda sonora potente e bem ritmada. É então que todos os problemas ficam para trás e, não fossem os restantes carros que ocupam as pistas, estou certa que conseguiríamos mesmo voar.

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